sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Telemarketing


         Como todo processo que está no auge da utilização, o telemarketing tem proporcionado bons comentários, pesadas críticas e até algumas piadas de qualidade.
         Como temos na nossas relações pessoas que trabalham no ramo, e por termos sido criados com algum rigor pela Dona Maria, procuro ser sempre cortes  sempre que o telefone toca e vem aquela voz nos dizendo:
         — Posso falar com o dono da casa?
         Ou então:
         — É o Sr. Sergio?
         A gente já fica meio precavido, pois ao responder — É ele — em qualquer dos casos, dá início a um discurso preparado, e que não te dá chance de responder.
         Apesar das críticas que leio, e principalmente das broncas que escuto de algumas pessoas, o sistema deve funcionar, pois é uma regra básica do capitalismo. Ninguém investe no que não dá lucro. Como em tudo alguns exageros devem ser aparados, o treinamento de alguns operadores pode ser melhorado, mas vamos em frente.
         Mas por que estou falando nisso?
         É que um dia desses, tocou mais uma vez, e lá fui eu atender:
         — Pois não
         — Por favor. Com quem estou falando?
         — Com quem você deseja falar?
         — É o Sr. Sérgio?
         — É ele.
         — Aqui é do Grupo Flamboyant
         Pronto, pensei, lá vem outro. Vamos ouvir um pouco e nos livrar.
         — Pois não.
         — Estamos oferecendo um convênio de serviço funerário.
         Antes que eu perguntasse como, sem me dar tempo sequer de responder, ela continuou seu discurso ensaiado.
         — Além do senhor garantir a cobertura das despesas do seu funeral, ainda recebe gratuitamente um plano de saúde com cobertura médica e odontológica.
         Aproveitei que ela parou para respirar e antes que ela prosseguisse, fui logo dizendo:
         — Obrigado, mas já tenho plano de saúde e possuo cobertura para despesas de funeral.
         — Ah! – dava para perceber a decepção na vozinha dela – então muito obrigado pela sua atenção e até logo.
         Desliguei, e imediatamente me arrependi.
         Primeiro, venho uma sentimento de solidariedade pela vendedora. Já não é fácil este serviço de telemarketing ativo, onde você fica ligando para as pessoas oferecendo coisas que elas, na maioria das vezes, não precisam. Vender túmulo em cemitério então, deve ser mais difícil ainda. E olha que todo mundo vai precisar
         Logo depois, venho uma preocupação:
         Como seria esse convênio médico que vinha de brinde? Bom ou ruim? Ou, pior ainda, adaptável. Já vejo o diretor dizendo pros seus assessores:
         — Nossa cota de enterro está baixa. Precisamos incrementar a produção. Avisa o pessoal da saúde para providenciar um aumento no número de clientes.
         Ou então:
         — As despesas de funeral ultrapassaram a meta. Avisa o pessoal da saúde para não deixar ninguém morrer.
         O negócio, antes de marcar consulta, é dar uma olhada no balancete da firma. Dependendo do resultado, é melhor ficar doente um tempinho mais.
         Por outro lado, faço uma pergunta aos técnicos: Plano de saúde funciona baseada em estatística, ou seja, do total de pagantes, uma parte utilizará bastante e outra pouco. Mas no caso em pauta, cem por cento dos associados do plano funeral vai utilizar o serviço, mais cedo ou mais tarde. Como fazer os cálculos?
         Bom, deixa eu parar aqui que o telefone está tocando e, pela minha estatística, deve ser doação pois já faz bem uns três dias que não recebo este tipo de chamada.
         — Pois não
         — Posso falar com a dona da casa?
         Oba, me livrei dessa, vou cuidar do meu jardim



terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Envelhecer

Um pouco de poema, que também andei acometido desta doença

ENVELHECER

É abril, as folhas caem
O outono se anuncia
Parece começo de samba canção
Ou ainda, de melosa música sertaneja
(da pior qualidade)

É abril, o processo está completo
Depois do nascer da primavera
A fertilidade do verão
E o tempo de aposentar está chegando
Parece começo de fim
Que o homem tem que transformar
Em novo início

O inverno se aproxima, no ano
O frio se aproxima, no tempo
Dificuldade em lembrar
            em andar
            em falar

Para não se entregar
Há que valorizar a liberdade de opinar
Que será chamada de teimosia

Virar consultor familiar
Aquele repositório de informações inúteis
E histórias inverídicas, imaginadas
Que os novos virão consultar
Poucas vezes por necessidade
A maioria por educação

Para eles será como acessar um computador
Pedindo informações
Nada de se alongar
Só um resumo
E basta

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

NOME DE RUA

         Não sei como, ou melhor até sei o como, e o porquê, só não sei mesmo o para quê. Virar nome de rua deve ser o sonho de muita gente. É um tal de político colocar o nome do pai, do avô, da mãe.
         Mas e o homenageado? O que ele acha daquilo? Qual a opinião que ele teria? Alguém alguma vez perguntou pro nome do dono o que ele achava daquela homenagem? Pois deviam.
         Começa pelo perigo. Você pede para colocar o nome do seu pai numa rua. Aquele que você considera um santo, que em vida era assíduo freqüentador de igreja, benemérito participante da comunidade, esteve à frente de todos os movimentos moralizadores do seu bairro. Um exemplo para os cidadãos e os netos. E você convence um vereador a fazer a proposta e lá está o seu pai nome de rua. E a rua, por uma destas ironias vira ponto de travecos e prostitutas. Ou abre um cassino ali, bem no meio da rua. Seu pai que brigou até com sua mãe quando ela, brincando com a comadre sobre um doce disse sorrindo:
         — Aposto que o meu é melhor!
         O velho levantou lá da sala, e disse que não aceitava nem brincando que se apostasse. Que a aposta era o caminho da perdição etc. E agora está ali, dando endereço para bingo. Ou em manchete policial de jornal:
         RUA ANTONIO MENDES TORNA-SE PROBLEMA DE SEGURANÇA
         Pode ser também que pela habitual imperícia dos nossos prefeitos, a rua em que você pediu para colocarem o nome da sua mãe, aquela santa da Dona Matilde Silva, seja toda esburacada, com armadilhas para o motorista. E um grita para o outro:
         — Não passa naquela merda da Matilde Silva, aquilo tá muito ruim.
         Pronto, dona Matilde que em vida nunca deu motivo para ninguém falar um aí que seja dela, está na boca do povo, sendo humilhada, virando merda.
         Risco maior correm aqueles que aceitam que os seus parentes substituam nomes consagrados pelo povo, mas que algum nobre edil resolve que Travessa do Furo Em Baixo não fica bem numa cidade progressista como a dele. E vai escolher um nome. E como bom puxa saco sugere a mãe do prefeito:
         A Travessa do Furo Em  Baixo passa a chamar-se Olga Mayor em homenagem à mãe do nosso prefeito.
         E lá vem o povo a estragar a homenagem: Onde é? Na Travessa da Olga do Mayor  Furo Em Baixo.
         Pega mal, não pega?
         Por isso, também pensei no assunto. Quem sabe um dia não tenho um filho ou filha poderoso, até um genro ou nora, ou até mesmo um dos netos com capacidade de determinar nome de rua e  alguém, para lhes puxar o saco, queira me homenagear, não pelo que eu fiz, que não pretendo fazer nada mesmo, mas pelo simples de ser um parente morto disponível.
         Solicito então de forma veemente que, se não for possível recusar, nunca se sabe, afinal, o dia de amanhã, procurem ter alguns critérios na escolha do endereço que vai levar o meu nome.
         Deve ser uma rua curta, dois ou três quarteirões, no máximo. De preferência, começando e terminando em ruas secundária, daquelas que quem passa por ela, é porque tem que ir ali.
         Se puder ter uma escola, creche, ou parque infantil seria bom, afinal crianças são sempre bem vindas em qualquer lugar decente. Casas simples, como dizia a música, com cadeiras na calçada, e na varanda escrito em cima “aqui é um lar”.
         Por favor, reparem bem se não tem igrejas, nem templos, de nenhuma espécie. Não que eu seja contra a religião, muito pelo contrário, que eu não dou conta nem das forças daqui, não vou querer encrenca com as do além, mas já vou estar morto mesmo, minha oportunidade de freqüentar igrejas já passou, e além disso, tenho em mim que ultimamente as pessoas estão indo a estes lugares para se esquecer do mundo aqui fora, e na minha rua, quero gente que goste deste mundo.
         Lógico que ela seria calçada, pois os moradores querem ter um pouco do conforto urbano, mas seria bom se em vez de asfalto tivesse pedras, lajotas ou paralelepípedos, para que uma grama teimosa nascesse entre elas.
         Tomara que em junho, os moradores da minha rua, num fim de semana, a fechem nas esquinas e coloquem mesas no meio, com alguns doces e pipocas, para se comemorar os santos do mês, acendendo uma fogueira num dos cantos para que as crianças possam brincar e se divertir sob a vigilância dos pais. E que na época dos jogos importantes da seleção, se reunam todos para comemorar as vitórias ou repartir as tristezas da derrota.
         E no Natal e Ano Novo, as pessoas se coatizem e comprem bastante fios com lampadinhas, iluminando as árvores da minha rua, e que se confraternizem, esquecendo as fofocas e briguinhas que tiveram durante o ano.
         Que uma menina namore no portão, e saia dali para iniciar a vida em outro lugar, mas nunca esquecendo a rua onde foi criada, querendo transportar a magia que existia ali para outros lugares.
         Que um casal consiga ali comprar sua casa financiada, e que ali monte sua família, até que ele, já aposentado, e com a casa paga, possa gozar de uma velhice tranqüila.
         E que se Deus me permitir eu seja personagem da canção que as crianças brincando cantarão alto, e as mães, bem baixinho, para os nenes:
         Nesta rua,
nesta rua
tem um anjo
         Que se chama
que se chama
         (....)  Se você chegou até aqui e gostou, neste espaço coloque o nome
de sua predileção.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

HISTÓRIAS DE CRIANÇA


Quando comecei a ser avo.

Estavam três brincando, dois meninos e uma menina. Aí, um dos meninos quis fazer xixi, os outros foram atrás. Minha neta ficou olhando, e quando um deles, de três anos acabou,  ela perguntou:
- Você tem piu piu?
E ele, na hora
- Não. Tenho um cachorrinho. Ele chama Bruce.


Fomos dar comida ao cachorro. Ao irmos embora, disse para ela: Fala tchau para o Guga. E ela, gritando
- Tchau Guga
Aí então, resolvi dizer:
 - Você ouviu, ele respondeu
E ela, em cima do que eu disse:
- Ele não fala, vô. Ele é cachorro ainda


Tenho o hábito de fumar cachimbo. Mas evito fazê-lo próximo aos outros, porque sei que o cheiro pode não ser agradável para todos. Com muito mais razão ainda, nunca havia fumado na frente da minha neta.
Um dia destes, estando sozinho, resolvi acender o cachimbo. Mas, logo meu filho chegou e entrou com ela, que parou perto, e ficou olhando um bom tempo para o avô, com aquele negócio na boca, até que disse:
-  Igual o saci-pererê não é vovo?